Vida X Morte



No poema que se tem na sequência, verifica-se que o "eu-lírico" não deseja morte, pelo contrário, pois o que se nota é um forte desejo de aproveitar e usufruir dos prazeres que a vida oferece. Interessante analiser toda a construção da poesia, pois Castro Alves estava condenado a morte vítima de sua saúde debilitada, mas ele lutou muito pela sua vida. Portanto, pode-se traçar um parelelo entre a vida real do autor e a sua obra literária.



MOCIDADE E MORTE
Castro Alves

Oh! eu quero viver, beber perfumes
Na flor silvestre, que embalsama os ares;
Ver minh’alma adejar pelo infinito.
Qual branca vela n’amplidão dos mares.

No seio da mulher há tanto aroma...
Nos seus beijos de fogo há tanta vida...
— Árabe errante, vou dormir à tarde
À sombra fresca da palmeira erguida.

Mas uma voz responde-me sombria:
Terás o sono sob a lájea fria.

Morrer... quando este mundo é um paraíso,
E a alma un cisne de douradas plumas:
Não! o seio da amante é um lago virgem...
Quero boiar à tona das espumas.
Vem! formosa mulher — camélia pálida,
Que banharam de pranto as alvoradas.
Minh’alma é a borboleta, que espaneja
O pó das asas lúcidas, douradas...

E a mesma voz repete-me, terrível,
Com gargalhar sarcástico: — Impossível!

Eu sinto em mim o borbulhar do gênio.
Vejo além um futuro radiante:
— Avante! — brada-me o talento n’alma
E o eco ao longe me repete — Avante! —
O futuro... o futuro... no seu seio...
Entre louros e bênçãos dorme a glória!
Após — um nome do universo n’alma
Um nome escrito no Panteon da história.
E a mesma voz repete funerária:
Teu Panteon — a pedra mortuária!
Morrer — é ver extinto dentre as névoas
O fanal, que nos guia na tormenta:
Condenado — escutar dobres de sino,
— Voz da morte, que a morte lhe lamenta.
—Ai! morrer — é trocar astros por círios,
Leito macio por esquife imundo,
Trocar os beijos da mulher — no visco
Da larva errante no sepulcro fundo.

Ver tudo findo... só na lousa um nome,
Que o viandante a perpassar consome.

E eu sei que vou morrer... dentro em meu peito
Um mal terrível que me devora a vida:
Triste Ahasverus, que no fim da estrada,
Só tem por braços uma cruz erguida.
Sou o cipreste, qu’inda mesmo florido,
Sombra da morte no ramal encerra!
Vivo — que vaga sobre o chão da morte,
Morto — entre os vivos a vagar na terra.

Do sepulcro escutando triste grito,
Sempre, sempre bradando-me: — Maldito! —

E eu morro, ó Deus! Na aurora da existência.
Quando a sede e o desejo em nós palpita...
Levei aos lábios o dourado pomo,
Mordi no fruto podre do Asfaltita.
No triclínio da vida — novo Tântalo —
O vinho do viver ante mim passa...
Sou dos convivas da legenda hebraica,
O estilete de Deus quebra-me a taça.

É que até minha sombra é inexorável,
Morrer! Morrer! soluça-me implacável.

Adeus, pálida amante dos meus sonhos!
Adeus, vida! Adeus, glória! amor! anelos!
Escuta, minha irmã, cuidosa enxuga
Os prantos de meu pai dos teus cabelos.
Fora louco esperar! fria rajada
Sinto que do viver me extingue a lampa...
Resta-me agora por futuro — a terra,
Por glória — nada, por amor — a campa.

Adeus!... Arrasta-me uma voz sombria,
Já me foge a razão na noite fria!...

3 comentários:

Prof. Adriane disse...

Parabéns, Everton, por abrir um espaço para a poesia.
Somente alguém com tamanha sensibilidade poderia criar tal espaço.
Dê uma passada no meu blog.
http://professoraadriane.blogspot.com

Abraços

Adri

Carmen Barudi GAUCHE disse...

essa imagem eu achei forte... mas muito bacana e o texto "ni que decir" muito "bão"

Anônimo disse...

Este poema está E-S-P-E-T-A-C-U-L-A-R!!!.............adorei..parabésn